Série Inclusão: antes excluídos, hoje índios e negros participam ativamente do processo eleitoral

Série Inclusão: antes excluídos, hoje índios e negros participam ativamente do processo eleitoral

Índio votando

Antes da chegada dos portugueses ao Brasil, cerca de cinco milhões de nativos habitavam o território nacional. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no censo de 2010, 817 mil pessoas se autodeclararam indígenas, representando 0,4% da população nacional.

Como o voto no Brasil é obrigatório, os índios são obrigados a votar se tiverem mais de 16 anos e se forem alfabetizados na Língua Portuguesa.  O Código Eleitoral (Lei n° 4.737/1965) veda o alistamento eleitoral daqueles que não saibam se exprimir na língua nacional, ou seja, aqueles que não saibam falar português.

No entanto, os índios, se viverem na aldeia e, segundo seus usos e tradições, o povo, coletivamente, decidir não votar, esta decisão prevalece sobre a obrigatoriedade da lei brasileira. Isso porque os povos indígenas têm o direito constitucional de viverem segundo seus usos, tradições e costumes. O índio também pode ser candidato, pois é um cidadão com todos os direitos políticos.

A própria Constituição Federal de 1988 estabelece proteção especial à cultura indígena para impedir a imposição de regras e comportamentos estranhos à sua organização social e cultural, ao mesmo tempo em que cria certas barreiras à elegibilidade e ao direito de votar.

De acordo com o Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/1973), os índios são considerados dentro de três categorias de civilização: os isolados, que vivem em grupos desconhecidos e têm pouco ou nenhum contato com a sociedade; os em via de integração, ou seja, aqueles que estão em permanente contato com a sociedade, embora preservem seus costumes, e aceitem algumas práticas e modos de existências diversos dos seus; e os integrados, reconhecidos no pleno exercício de direitos civis.

A mesma lei determina que os Índios e comunidades indígenas ainda não integrados ficam sujeitos ao regime tutelar da União. Entretanto, qualquer indígena pode requerer sua liberação do regime tutelar e assim adquirir a plenitude da capacidade civil.

Alguns requisitos são necessários: idade mínima de 21 anos, conhecimento da Língua Portuguesa, habilitação para o exercício de alguma atividade útil e razoável e compreensão dos usos e costumes da comunhão nacional.

Em decisão de dezembro de 2011, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) assegurou o alistamento eleitoral em caráter facultativo aos índios considerados pelo Estatuto do Índio como isolados e em vias de integração. Pela decisão, os índios alfabetizados devem se inscrever como eleitores, mas não estão sujeitos ao pagamento de multa pelo atraso no alistamento eleitoral. Essa orientação está prevista no artigo 16 da Resolução nº 21.538/2003 do TSE.

O Tribunal definiu ainda que, por ocasião do alistamento eleitoral, aqueles indígenas que não possuem registro civil de nascimento poderão apresentar como documento válido o registro administrativo correspondente expedido pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

Negros

Na história política do Brasil, por muito tempo, mulheres, negros, pobres e analfabetos não votavam. É impossível tratar da cidadania dos negros brasileiros e da promoção de seus direitos humanos sem que se faça uma leitura do passado. Isso porque, com relação ao voto dos negros, nunca houve proibição formal, mas velada. Quando da escravidão, os escravizados eram considerados propriedade de seu senhor, portanto, não possuíam direitos. Depois, o impedimento veio por conta da proibição do voto para os analfabetos.

Até o final do Século XX, os conceitos de direitos humanos, se aplicados aos povos indígenas, aos negros e às mulheres foram materializados de forma desigual. Os negros, em razão da sua condição jurídica de escravizados, não eram considerados cidadãos, sendo a eles vedada, portanto, a participação nos processos políticos formais. Isso ocorreu em todo o período colonial e imperial até a abolição da escravatura.

A escravidão foi a instituição econômica e política mais longa da história brasileira. Mesmo com os negros sendo a maioria da população durante os anos finais da escravidão – mais de cinco milhões de africanos foram trazidos como escravos para o Brasil –, eles eram tratados como sub-humanos, não tinham o status de estrangeiros, nem os direitos de cidadãos brasileiros.

De acordo com Ane Ferrari Ramos Cajado, historiadora do Museu do TSE, no Império, os libertos, ex-escravizados que adquiriram sua liberdade, podiam votar apenas como eleitores de primeiro grau, mas tinham assegurada, de acordo com o texto da Constituição, a cidadania brasileira. A situação dos libertos e dos ingênuos – os nascidos do ventre livre da mãe escrava – era controversa e fez correr muita tinta nas discussões da época.

“Como a Constituição de 1824 restringiu apenas o direito de voto dos libertos – nada mencionando sobre os ingênuos –, seria possível entender que os ingênuos não estavam excluídos do rol dos eleitores de segundo grau, tampouco proibidos de serem eleitos. Essa interpretação não era unânime, razão pela qual muitas discussões ocorreram sobre a situação tanto de uns quanto de outros, principalmente com a proximidade da promulgação da Lei do Ventre Livre, em 1871. Se a legislação permitia múltiplas interpretações, a realidade era ainda mais complexa, ocorrendo situações inusitadas, como a do fazendeiro João José da Costa, juiz de paz da freguesia de Jurujuba, em Niterói-RJ, que teve sua eleição contestada sob a suspeita de ser liberto”, explica Ane Cajado.

Com a proximidade da abolição da escravização de pessoas, em 1881, uma reforma eleitoral no Império, conhecida como Lei Saraiva, aboliu o voto do analfabeto. Muitos historiadores fazem uma conexão entre a Lei Saraiva e a abolição, tendo em vista que a grande massa de negros egressos do cativeiro era de analfabetos, que estariam, assim, excluídos do processo eleitoral.

A historiadora do Museu do TSE afirma ainda que, a partir da abolição, em 1888, os negros passaram a poder, formalmente, participar do processo eleitoral, o que, na prática, não se efetivou em razão, por um lado, da proibição do voto do analfabeto e, por outro, em decorrência do conjunto de estigmas construídos em torno da identidade negra. Tais estigmas foram elaborados a partir de teorias cientificistas que enunciavam a inferioridade de determinadas raças frente a outras, a propensão natural de determinados grupos para o crime, a vinculação de determinadas doenças/epidemias a alguns grupos étnicos, entre outros.

Esse estigma pode ser bem percebido diante da dificuldade que enfrentou o deputado Monteiro Lopes que, por ser negro, ganhou diversas eleições, mas sua diplomação não ocorria, sendo alegada uma série de fatores impeditivos, diz Ane Cajado. Uma campanha foi organizada no Brasil inteiro e, finalmente, ele foi empossado deputado federal em 1909.

Assim, as questões em torno da participação política dos negros, com o fim da escravização, devem ser mais bem compreendidas dentro de um contexto mais amplo de luta dessas pessoas por inclusões de toda ordem: de renda, educacional e de moradia, entre outras.

O Tribunal Superior Eleitoral estuda a possibilidade de incluir uma pergunta sobre raça e cor no registro das candidaturas. De acordo com os dados do IBGE, os negros (pretos e pardos) correspondem a 51% da população brasileira.

BB/LC

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