Mulheres discutem o impacto da violência política na representatividade feminina nas casas legislativas

Painel do seminário “Mais Mulheres na Política - sem violência de gênero” reuniu magistradas, parlamentares e estudiosas do tema

Mais Mulheres na Política - sem violência de gênero - 18.10.2021

O segundo painel do seminário “Mais Mulheres na Política - sem violência de gênero”, na tarde desta segunda-feira (18), teve como tema “Violência política de gênero no Brasil – Verdades e perspectivas”. O debate foi mediado pela ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Maria Cláudia Bucchianeri Pinheiro e contou com a participação da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia; da representante para o Brasil da agência ONU Mulheres, Anastasia Divinskaya; da deputada federal Celina Leão (PP-DF); da presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Renata Gil; da senadora Simone Tebet (MDB-MS); e da promotora de justiça do estado da Bahia Lívia Vaz.

O objetivo do seminário foi reunir especialistas, parlamentares e autoridades para uma reflexão ampla e plural sobre as práticas abusivas enfrentadas ainda hoje. A proposta foi apontar os diferentes tipos de comportamentos relacionados à discriminação política de gênero, a fim de discutir mecanismos de proteção às mulheres que atuam em cargos nas casas legislativas.

Os debates também abordaram a necessidade de atenção à situação das mulheres negras, indígenas, LGBTQIA+ e com deficiência, que sofrem duplamente por fazerem parte de um grupo mais vulnerável socialmente. O evento foi aberto ao público e transmitido ao vivo pelo canal do Tribunal no YouTube, com tradução simultânea em Língua Brasileira de Sinais (Libras).

“Abaixo de cachorro”

Primeira a falar, a ministra Cármen Lúcia fundamentou a luta para a maior participação das mulheres na política no inciso I do Artigo 5º da Constituição Federal, que estabelece que homens e mulheres são iguais em direitos e deveres perante a Lei. A exclusão da participação feminina na política, que se faz histórica no Brasil, segundo a ministra, “leva à morte cívica, à morte física, à morte intelectual de mulheres pelo mundo afora, e de uma forma específica no Brasil”.

A “violência cívica”, como denominou Cármen Lúcia, tem o seu lugar ao lado de outras formas de violência infligidas às mulheres, como a física, a moral, a patrimonial e a psicológica. E fazendo um paralelo com a nova legislação que coíbe os maus tratos a cães e gatos, a ministra destacou que a pena mínima para os maus tratos contra os animais domésticos é a mesma que a máxima para maus tratos psicológicos contra mulheres. “Agora, no Brasil, literal e legalmente, eu, como mulher, estou abaixo de cachorro”, pontuou.

Brasil em 133º lugar

A representante da ONU Mulheres no Brasil, Anastasia Divinskaya, apresentou uma série de dados que traçam o quadro da presença feminina na política brasileira, em comparação com outros países. Segundo ela o Brasil, embora tenha 52% de mulheres eleitoras, está abaixo da média mundial na representação feminina na política: elas são menos de 15% dos representantes eleitos.

Com apenas 14,35% de eleitas para a Câmara dos Deputados, o Brasil é o 133º país no ranking da União Interparlamentar (UIP) sobre a participação de mulheres em câmaras baixas.  Em cargos ministeriais, o Brasil ocupa o 144º lugar no ranking mundial de representatividade feminina e o 142º no ranking de representação parlamentar. Na América Latina, fica à frente apenas das Bahamas, Belize e Haiti. Nas Eleições Municipais de 2020, 16 municípios brasileiros não elegeram sequer uma mulher vereadora.

Anastasia reconheceu que houve avanços no estímulo à presença feminina na política, mas que ainda há muito a ser feito. A causas dessa sub-representação são bem conhecidas, segundo ela: patriarcado, desigualdade estrutural e múltiplas formas de discriminação. “Temos dados que mostram que a violência contra as mulheres que ocupam cargos públicos e de decisão política tem um impacto arrepiante na ambição política das mulheres jovens”, revelou a representante da ONU Mulheres. Esse, segundo ela, é um efeito desejado por quem realiza essa violência.

Dobro de mulheres eleitas

“Eu sou fruto da luta de mulheres que estavam em situação de poder”, disse a deputada Celina Leão (PP-DF), presidente da Frente Parlamentar de Defesa dos Direitos da Mulher e coordenadora-geral da Secretaria da Mulher na Câmara dos Deputados. Ela destacou que, nas Eleições Gerais de 2018 e nas Municipais de 2020, foi possível dobrar o número de mulheres eleitas graças à cota de gênero para a distribuição do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), conhecido como Fundo Eleitoral, e para o tempo de propaganda no rádio e na televisão.

A deputada ressaltou que essas conquistas aconteceram na seara do Poder Judiciário porque, segundo ela, o ambiente do Poder Legislativo ainda é muito machista. Para Celina Leão, essa situação só será revertida com a conquista de uma maior representatividade feminina no Parlamento, para que iniciativas que protejam e beneficiem mulheres possam progredir sem enfrentar obstáculos de gênero. Hoje, ela destacou, mulheres deputadas presidem sete comissões permanentes e ocupam três cargos na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.

Ela apontou que o crime de violência política, com pena de três meses a seis anos de reclusão, foi incluído no Código Penal por meio da atuação da deputada Margarete Coelho (PP-PI), relatora do projeto. E que, na discussão do Código Eleitoral, também relatado por Margarete, foram incluídos diversos dispositivos que beneficiam candidaturas de mulheres e negros, como a contabilização em dobro dos votos a esses dois grupos para efeitos de cálculo dos repasses do Fundo Partidário, entre outros.

Profundo processo de mudança

Ao tomar a palavra, a juíza Renata Gil, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), apontou que o Brasil passa, nos últimos tempos, por um profundo processo de mudança, onde muitas mulheres têm ocupado espaços de poder. “Nós, que ocupamos esses espaços de poder, precisamos no unir e nos posicionar publicamente contra a violência contra a mulher”, conclamou.

O próximo passo na luta no combate à violência de gênero, segundo Renata Gil, é o projeto de lei que torna obrigatória a realização de uma semana de estudo de violência contra a mulher nas escolas e a inclusão, na grade curricular dos estudantes, de noções de combate às agressões de gênero. “Essa lei é a que vai fazer a virada de página, que vai quebrar esse paradigma de violência. Tenho certeza de que vamos colher muitos bons frutos daqui para frente”, acredita.

Sempre filhas ou esposas de homens públicos

A senadora Simone Tebet apontou que o processo de promoção da presença feminina na política tem se desenvolvido com mais rapidez nos últimos anos. Fazendo um retrospecto da história da democracia brasileira, Tebet apontou que levou séculos para a mulher poder votar, décadas para poder ser eleita. E hoje já há a conquista de cotas de financiamento e tempo de propaganda para candidaturas femininas.

Isso, ela conta, ajudou a terminar com a concepção de que mulheres na política tinham sempre que ser filhas ou esposas de algum homem público. E as cotas de gênero encerraram a prática de subfinanciamento das campanhas femininas, que recebiam bem menos recursos quando em comparação aos candidatos do sexo masculino. Com a inclusão da violência política como tipo do Código Penal, as mulheres tiveram assegurado o direito de voz na política brasileira.

A dor do corpo negro

“É importante nomear nossas dores”, apontou Lívia Vaz, promotora pública do estado da Bahia, ao deixar claro o porquê da importância de que mulheres – em especial, as mulheres negras – ocupem espaços na política para, assim, poderem trazer para o debate público as dificuldades que enfrentam em seu cotidiano.

A atenção às mulheres negras, segundo ela, se deve ao fato de que essa parcela da população é vítima ao mesmo tempo de duas formas distintas de opressão: a opressão sexista, por serem mulheres, e a opressão racista, por serem negras. E isso, explica Lívia Vaz, as expõe a um grau maior de violência, que configura um feminicídio negro. “Quando eu falo das diferenças, não é para nos separar. Eu falo das diferenças para amplificar o olhar de quem não sofre as dores que o meu corpo negro sofre”, concluiu.

RG/LC, DM

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