Criação e funcionamento de partidos políticos à luz da Constituição Federal de 1988

O artigo 17 da Constituição Federal de 5 de outubro de 1988 determina que é livre a criação, fusão, incorporação e  extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana. Assegurou também ao partido político autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento, bem como manteve a exigência do caráter nacional do partido político, instituída pelo Código Eleitoral, Decreto nº 7.586/1945.

A partir de 1988, foi necessário produzir uma norma que disciplinasse o art. 17 da Constituição, uma vez que a Lei Orgânica dos Partidos Políticos – LOPP (Lei nº 5.682/1971), em vigor na época, já não mais cumpria o seu papel dentro da visão  inovadora da nova Constituição. Assim, foi sancionada a Lei nº 9.096/95 e editada a Res.-TSE nº 19.406/95, revogada pela Res.-TSE nº 23.282/2010, que disciplinam a fundação, a organização, o funcionamento e a extinção dos partidos políticos de acordo com as ideias dos legisladores de 1988.

Dentre outras coisas, a legislação permite que o próprio partido estabeleça regras para a realização de suas convenções, determine prazos superiores àqueles previstos na lei para que o filiado possa concorrer a eleições e ainda permite criar uma estrutura diferente da existente em outros partidos.

Até a entrada em vigor da nova lei, os partidos não tinham essa autonomia, pois seus atos internos eram submetidos à norma geral dirigida a todos os partidos – a LOPP –, bem como aos cuidados da Justiça Eleitoral.

Atualmente, as questões internas são resolvidas dentro do próprio partido, nos termos do estatuto, e, se questionadas judicialmente, após percorridas todas as instâncias dentro do próprio partido, compete à Justiça Comum processar e julgar tais casos. Entretanto, há exceções. Dentre elas, aquelas que envolvam filiados impossibilitados de disputar eleições
e não haja mais tempo suficiente para se filiar a outra legenda, bem como os casos de infidelidade partidária, que são apreciados pela Justiça Eleitoral.

Ressalte-se que, enquanto a LOPP vigorou, o processo de registro de partidos políticos começava no TSE. Era necessário que o interessado apresentasse cópia do manifesto, do programa, do estatuto e da ata de sua fundação, a qual comprovasse a formação de, pelo menos, nove comissões regionais provisórias, com prova de publicação desses atos no Diário Oficial da União (DOU). A partir de então, era concedido um prazo de doze meses para que o partido se organizasse e obtivesse seu registro definitivo.

Os partidos com registro provisório concedido funcionavam como agremiações de fato e de direito, podendo, inclusive, participar de eleições, até que obtivessem seus registros definitivos deferidos pela Justiça Eleitoral. A lei que estabelecia normas para a realização das eleições municipais de 1988 (Lei nº 7.664/88) trazia expressamente essa permissão.

A partir da edição da Lei nº 9.096/95, o registro provisório passou a não mais ser permitido. Para registrar um partido político, o interessado tem que cumprir todos os requisitos estabelecidos na Lei dos Partidos Políticos e na Res.-TSE nº 23.282/2010. Assim, devem reunir-se os fundadores (pelo menos 101 eleitores), com domicílio eleitoral em, no mínimo, um terço dos estados, para elaborar o programa e o estatuto do partido, que deverá ser publicado no DOU. Nessa mesma reunião, serão eleitos, em caráter provisório, os dirigentes nacionais, que vão organizar o partido.

Após a publicação no DOU, promove-se o registro do partido no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas da Capital Federal.

Obtido o registro no cartório, momento em que o partido em formação adquire personalidade jurídica, deve-se comunicar aos tribunais regionais o nome dos representantes que serão responsáveis pela entrega das listas do apoiamento mínimo de eleitores nos cartórios eleitorais.

O apoiamento mínimo consiste no colhimento das assinaturas correspondentes, no mínimo, a meio por cento (0,5%) dos votos válidos, dados na última eleição geral para a Câmara dos Deputados, não computados os brancos e nulos, que deverão estar distribuídas em pelo menos nove estados. Além dessa exigência, em cada estado, deve-se atender ao mínimo de um décimo por cento (0,1%) do eleitorado.

É importante ressaltar que, com esse apoiamento, materializa-se o caráter nacional do novo partido.

Em seguida, o partido deverá constituir, definitivamente, na forma de seu estatuto, os órgãos diretivos municipais e  regionais, registrando-os nos tribunais regionais eleitorais de, no mínimo, nove unidades da federação.

Registrados os órgãos partidários municipais e regionais nos tribunais regionais, deverá ser solicitado o registro do programa, do estatuto e do órgão de direção nacional no TSE, última fase do processo de registro.

A partir desse deferimento, o partido terá assegurada a exclusividade da denominação e da sigla, do número de legenda e dos símbolos,bem como estará apto a receber recursos do fundo partidário, a ter acesso gratuito ao rádio e à televisão e a participar do processo eleitoral.

Nota-se que a legislação brasileira evoluiu no sentido de afastar a possibilidade da influência ideológica do Estado sobre os partidos políticos, garantindo independência e autonomia nos procedimentos ligados a sua estrutura e a seu funcionamento. Dessa forma, essa liberdade partidária se apresenta como uma homenagem à natureza republicana e democrática da Constituição de 1988 e como elemento que fortalece o Estado democrático de direito.