Informativo TSE - nº 4/2022

SESSÃO JURISDICIONAL

 

Constitucionalidade da aplicação imediata da anistia prevista no art. 55-D da Lei nº 9.096/1995

É constitucional a incidência da anistia prevista no art. 55-D da Lei nº 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos).

Trata-se de recurso especial eleitoral interposto pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) contra acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul (TRE/RS) que havia declarado incidentalmente a inconstitucionalidade da previsão de anistia de repasse dos valores devidos em razão de imposição de penalidade pecuniária, instituto criado pela Lei nº 13.831/2019, a qual alterou a Lei dos Partidos Políticos.

Em seu voto, o Ministro Edson Fachin, relator, entendeu cabível o reconhecimento da presunção de constitucionalidade da norma, afastando a inconstitucionalidade declarada nas instâncias inferiores, entendimento que foi seguido pela unanimidade do Plenário.

O Ministro Alexandre de Moraes, abrindo divergência do relator após pedido de voto-vista, argumentou que a anistia das penalidades aplicadas aos partidos relativas aos exercícios anteriores a 2019, instituída no art. 55-D, deve ser aplicada imediatamente, até que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue a sua constitucionalidade na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6.230, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski. Ademais, ressaltou que a apuração dos valores anistiados deveria ficar a cargo do juízo da execução.

Sendo assim, por maioria, o Tribunal deu parcial provimento ao recurso especial eleitoral para autorizar a incidência da anistia prevista no art. 55-D da Lei nº 9.096/1995, ficando a cargo do juízo da execução a apuração dos valores anistiados, mantendo-se a desaprovação das contas partidárias, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, vencido parcialmente o Ministro Edson Fachin (relator). Acompanharam a divergência os Ministros Ricardo Lewandowski, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Recurso Especial Eleitoral nº 0600003-52.2019.6.21.0128, Passo Fundo/RS, redator para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 22/3/2022.

Não há fundamentação legal para que seja exigida do partido político a devolução ao Erário de valores considerados como dívidas de campanha.

A existência de dívida de campanha não assumida pelo partido político compromete a transparência das contas prestadas, entretanto não deve ser equiparada a recurso de origem não identificada.

Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra acórdão de Tribunal Regional Eleitoral em que desaprovadas as contas de campanha de candidato ao cargo de deputado federal nas Eleições 2018, ocasião em que fora determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 5.455,47 (cinco mil, quatrocentos e cinquenta e cinco reais e quarenta e sete centavos), correspondente aos gastos irregulares de recursos públicos

O recorrente alegou, em síntese, violação ao art. 34 da Res.-TSE nº 23.553/2017, com o entendimento de que dívida de campanha não quitada e não assumida pelo partido político configura recurso de origem não identificada, visto que as receitas utilizadas para seu pagamento não transitarão pela conta de campanha nem serão fiscalizadas pela Justiça Eleitoral, impondo-se a devolução ao Tesouro Nacional do valor tido por irregular.

Assim, requereu a reforma do acórdão regional a fim de que fosse determinado o ressarcimento ao Erário do valor total de R$ 110.422,50 (cento e dez mil, quatrocentos e vinte e dois reais e cinquenta centavos) a título de recurso de origem não identificada, nos exatos termos do art. 34 da Res.-TSE nº 23.553/2017, cuja aplicação não se restringe somente ao período eleitoral.

A Corte regional tinha afastado a devolução do montante total ao Erário sob o fundamento de que “dívida de campanha não assumida pela agremiação nacional do partido constitui contratação de despesa não adimplida que não se confunde com a utilização de recurso de origem não identificada”.

Na sessão plenária de 13/10/2020, o Ministro Luís Roberto Barroso antecipou pedido de vista para analisar a matéria afeta à obrigação de devolução de valores ao Erário na hipótese de existência de dívida de campanha. Em voto-vista, consignou:

i) Em primeiro lugar, a assunção da dívida pelo partido não é um procedimento obrigatório e, tampouco, afasta a possibilidade de que o candidato obtenha diretamente os recursos para quitar as obrigações junto aos fornecedores. Isso porque a lei diz que o partido “poderá” assumir a dívida e, mesmo nesse caso, o candidato seguirá “solidariamente responsável” por ela. Portanto, é preciso considerar que não é, a priori, vedado ao cidadão que foi candidato adimplir a dívida de campanha por meio de rendas diversas que venha a auferir como pessoa física.

ii) Em segundo lugar, tratamos aqui de uma suposição: a de que recursos serão arrecadados para quitar a dívida de campanha. Até o momento, o que há, efetivamente, são despesas em aberto. A existência dessa dívida de campanha, de alto valor, não assumida pelo partido, sem dúvidas, compromete a transparência das contas prestadas. A irregularidade grave, aqui reconhecida, é a não quitação de despesas e a incerteza de que o serão. Por isso, acertada a desaprovação das contas do candidato, [...] . Mas medida diversa é, em juízo hipotético, considerar como de “origem não identificada” recursos que foram obtidos, o que significaria, em última análise, impedir o candidato de quitar a obrigação pela qual responde pessoal e individualmente.

iii) Em terceiro lugar, a determinação de que seja recolhida ao Tesouro Nacional quantia equivalente à dívida apenas agrava o problema detectado pelo Relator. Isso porque: (i) não afastará as obrigações comerciais do candidato, que seguirá tendo que amealhar recursos para pagar fornecedores; e, pior me parece, (ii) o candidato terá que duplicar o esforço de arrecadação de recursos junto a fontes não controladas pela Justiça Eleitoral, para além de pagar fornecedores, realizar o recolhimento ao Tesouro. (Grifo nosso.)

Com tais considerações e registrando que “a medida proposta não se mostra potencialmente efetiva para assegurar a transparência dos recursos que acaso venham a ser utilizados para quitar a dívida”, o Ministro Luís Roberto Barroso, em voto divergente, negou provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral.

O relator, então Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, havia assentado em seu voto infringência ao art. 35 da Res.-TSE nº 23.553/2017:

Art. 35. Partidos políticos e candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

[...]

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º; e Código Civil, art. 299).

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

§ 4º No caso do disposto no § 3º, o órgão partidário da respectiva circunscrição eleitoral passa a responder solidariamente com o candidato por todas as dívidas, hipótese em que a existência do débito não pode ser considerada como causa para a rejeição das contas do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 4º).

§ 5º Os valores arrecadados para a quitação dos débitos de campanha a que se refere o § 2º devem, cumulativamente:

I - observar os requisitos da Lei nº 9.504/1997 quanto aos limites legais de doação e às fontes lícitas de arrecadação;

II - transitar necessariamente pela conta “Doações para Campanha” do partido político, prevista na resolução que trata das prestações de contas anuais dos partidos políticos, excetuada a hipótese de pagamento das dívidas com recursos do Fundo Partidário;

III - constar da prestação de contas anual do partido político até a integral quitação dos débitos, conforme o cronograma de pagamento e quitação apresentado por ocasião da assunção da dívida.

§ 6º As despesas já contraídas e não pagas até a data a que se refere o caput devem ser comprovadas por documento fiscal hábil e idôneo emitido na data da realização da despesa ou por outro meio de prova permitido.

§ 7º As dívidas de campanha contraídas diretamente pelos órgãos partidários não estão sujeitas à autorização da direção nacional prevista no § 3º e devem observar as exigências previstas nos §§ 5º e 6º deste artigo.

No seu entender, tal fato impediria a Justiça Eleitoral de controlar a regularidade da movimentação financeira do candidato e que

a ausência de indicação da procedência das verbas a serem futuramente utilizadas para o pagamento dos débitos de campanha não quitados e não assumidos pelo partido político enseja o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor tido por irregular a título de recurso de origem não identificada.

Assim, deu provimento ao recurso especial eleitoral para determinar a devolução ao Tesouro Nacional da integralidade dos recursos, no valor de R$ 110.422,50 (cento e dez mil, quatrocentos e vinte e dois reais e cinquenta centavos), com fulcro nos arts. 24, § 4º, da Lei nº 9.504/1997 e 34 da Res.-TSE nº 23.553/2017:

Art. 24. É vedado, a partido e candidato, receber direta ou indiretamente doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I - entidade ou governo estrangeiro;

II - órgão da administração pública direta e indireta ou fundação mantida com recursos provenientes do Poder Público;

III - concessionário ou permissionário de serviço público;

IV - entidade de direito privado que receba, na condição de beneficiária, contribuição compulsória em virtude de disposição legal;

V - entidade de utilidade pública;

VI - entidade de classe ou sindical;

VII - pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba recursos do exterior. VIII - entidades beneficentes e religiosas;

IX - entidades esportivas;

X - organizações não-governamentais que recebam recursos públicos; XI - organizações da sociedade civil de interesse público.

Art. 34. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

O Tribunal, por maioria, negou provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral, nos termos do voto divergente do Ministro Luís Roberto Barroso, vencidos os Ministros Tarcisio Vieira de Carvalho Neto (relator) e Sérgio Banhos. Votaram com a divergência os Ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Mauro Campbell Marques e Benedito Gonçalves.

Recurso Especial Eleitoral nº 0601205-46.2018.6.12.0000, Campo Grande/MS, redator para o acórdão Min. Luís Roberto Barroso, julgado por videoconferência em sessão de 8.2.2022 (referente ao período do Informativo nº 2/2022, de 1º a 13 de fevereiro).

PUBLICADOS DJe

TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL
ACÓRDÃO
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600437- 76.2020.6.13.0177 - CHAPADA DO NORTE - MINAS GERAIS
Relator originário: Ministro Sérgio Banhos
Redator para o acórdão: Ministro Mauro Campbell Marques
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRAZO RECURSAL. ERRO DE INFORMAÇÃO NO PJE. BOA-FÉ. COOPERAÇÃO PROCESSUAL. PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. TEMPESTIVIDADE. AGRAVO INTERNO E AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL PROVIDOS.

1. O prazo para a oposição de embargos de declaração a acórdão de Tribunal Regional Eleitoral proferido em representação por propaganda eleitoral antecipada é de 24 horas, nos termos do art. 96, § 8º, da Lei nº 9.504/1997, o qual pode ser convertido em 1 dia. Precedentes.

2. O TRE/MG reconheceu que o PJe registrou o prazo recursal de 3 dias para eventual irresignação das partes contra o acórdão que negou provimento ao recurso eleitoral.

3. O presente caso não trata de modificação voluntária do prazo recursal nem de mudança arbitrária do prazo por iniciativa do juízo, mas de erro judiciário, haja vista que o Poder Judiciário não se pode furtar dos erros procedimentais a que deu causa (STJ: EREsp nº 1.805.589/MT, de minha relatoria, Corte Especial, DJe de 25/11/2020).

4. O equívoco na indicação do término do prazo recursal contido no sistema eletrônico mantido exclusivamente pela Justiça Eleitoral não pode ser imputado às partes, em respeito aos princípios da boa-fé, da cooperação processual de todos os que participam do processo judicial e, notadamente, da proteção da confiança, ante a legítima expectativa, dos sujeitos do processo, da fidedignidade das informações fornecidas pelo sistema processual gerido por esta Justiça especializada.

5. Na hipótese, o TRE/MG agiu com acerto ao assentar a tempestividade dos embargos de declaração, na medida em que a informação equivocadamente disponibilizada pelo PJe teve o condão de induzir a erro o ora agravante, não sendo razoável que seja prejudicado por fato alheio à sua vontade, mormente diante da inexistência de indícios de má-fé em sua conduta.

6. Provido o agravo interno para reconhecer a tempestividade dos embargos de declaração opostos ao acórdão regional que julgou o recurso eleitoral e provido o agravo em recurso especial para oportuna análise do apelo nobre.

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por maioria, em dar provimento ao agravo regimental, a fim de prover o agravo e dar prosseguimento ao exame do recurso especial eleitoral, nos termos do voto divergente do Ministro Mauro Campbell Marques, que redigirá o acórdão.

Brasília, 15 de fevereiro de 2022.

DJe de 21/3/2022

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