8º título eleitoral - 1957

Lei 2.550 – 25 07 1955

A eleição de Getúlio Vargas em outubro de 1950 assinalou a possibilidade do retorno do ideário do nacional-desenvolvimentismo, a ser adaptado para um ambiente institucional democrático. Contudo, mesmo anteriormente à posse, Vargas enfrentaria dificuldades políticas de monta, de sorte que o seu futuro mandato seria marcado por óbices significativos.

No projeto de Estado do político, a industrialização tinha um papel-chave. Muito embora em momento algum Vargas cogitasse implementar no Brasil um modelo autárcico, ou seja, em grande medida independente da conexão político-econômica com os países mais desenvolvidos, a aplicação do seu programa de desenvolvimento enfrentou uma oposição bastante acirrada, de tendência liberal, isto é, simpática às forças de mercado.

Grosso modo, o quadro delineou-se: os partidários do nacionalismo, enfileirados na defesa do monopólio do Estado nos setores básicos, do protecionismo à industria local, dos direitos da classe trabalhista, e, por fim, de uma política externa sem atrelagem automática à dos Estados Unidos. Por outro lado, os adeptos do liberalismo, encastelados em sua defesa da abertura total da economia, do distanciamento entre governo e trabalhadores e da aproximação entre a política exterior brasileira e a norte-americana.

Em linhas gerais, o Estado investiu maciçamente em infra-estrutura e procurou regular as atividades econômicas, de modo que tivesse melhores condições financeiras para a execução do seu plano de desenvolvimento. Datam dessa época o estabelecimento do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDE, ainda sem o S de social) e da Petróleo Brasileiro (Petrobras).

Esse modelo econômico entrou num impasse em 1953. No espírito da política de substituição de importações, o país necessitava de mais investimentos para importar maquinário de ponta, de alto custo, e disponibilizar a infra-estrutura adequada ao ritmo do crescimento – várias empresas diminuiriam a sua produção por causa da insuficiência do fornecimento de energia, por exemplo.

A crise na produção, por sua vez, acarretou a elevação do déficit na balança de pagamentos. Ao mesmo tempo, os preços do café no mercado internacional declinaram, ocasionando a diminuição na obtenção de divisas. Naquele ano, as reservas nacionais secariam. Saliente-se que os Estados Unidos eram os principais consumidores do café brasileiro, de sorte que Washington possuía considerável poder de persuasão sobre a economia brasileira.

No contexto internacional, a Guerra da Coréia – com a oposição entre Coréia do Sul e Coréia do Norte, sendo a primeira apoiada pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido, e a segunda, pela China e pela União Soviética – influenciou tanto a política interna como a economia do país. No primeiro caso, o conflito marcou um momento de grande tensão com os Estados Unidos, com a recusa de Vargas em enviar tropas brasileiras para combater ao lado das americanas, apesar da solicitação escrita do governo norte-americano nesse sentido. Além disso, a guerra prejudicou indiretamente a economia do país, já que se despenderam vultosas quantias com um grande volume de importação de produtos para estocagem, sob a justificativa de que poderia haver uma interrupção quase imediata no fornecimento.

Com o objetivo de manter a oferta de crédito e taxa de juros subsidiadas ao setor industrial, o governo optou por uma política emissionista que desembocou em inflação, com maior prejuízo para o setor trabalhista, base de apoio do governo Vargas. Para amenizar a crise, o salário-mínimo seria dobrado em maio de 1954, apesar das críticas da imprensa, dos militares e da oposição parlamentar contra a medida.

Anteriormente, em outubro de 1953, o governo havia publicado a Instrução nº 70, da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc) – organismo precursor do Banco Central do Brasil, estabelecido em fevereiro de 1945 –, com o intuito de coordenar a política monetária e creditícia do país. Pela norma, o Executivo tinha condições de se apropriar da diferença entre as taxas de importação – frutos de leilão – e as de exportação, sendo os exportadores obrigados a converter os pagamentos com moeda estrangeira em pátria. Com a diferença, o governo poderia financiar atividades consideradas essenciais.

Entretanto, a crise política sobrepujou as tentativas de reordenamento econômico. No final de agosto de 1954, oficiais da Aeronáutica exigiram, por meio de um manifesto, a saída do Presidente Vargas. Logo depois, seria a vez do Exército. Sem sustentação política e progressivamente isolado, Vargas não admitiria renunciar, optando pelo suicídio no dia 24 daquele mês.

A atitude, inédita na história pátria, provocou enorme comoção, ainda mais depois da divulgação da carta-testamento, de onde se extrai o celebre trecho final, em tom solene: “Eu vos dei a minha vida. Agora, vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente, dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história”.

A população nas ruas manifestou o seu descontentamento de maneira intensa – no Rio de Janeiro, então capital, um jornal de grande circulação, O Globo, seria empastelado e dependências da representação norte-americana seriam atacadas. O falecimento de Getúlio Vargas adiou o golpe militar por praticamente uma década.

Com a posse de Café Filho na titularidade da Presidência, assegurou-se a realização das eleições estaduais para aquele mesmo ano e a presidencial para outubro de 1955, a despeito de a União Democrática Nacional solicitar o seu adiamento. Nesse sentido, o desafio político mais importante em 1955 seria o de garantir a manutenção do regime democrático.

Em sua curta gestão, Café Filho inclinou-se a favor dos udenistas, o que levaria o Partido da Social Democracia e o Partido Trabalhista Brasileiro a unirem-se para o pleito presidencial com a seguinte chapa: Juscelino Kubitschek, representante do PSD de Minas Gerais, e João Goulart, do PTB do Rio Grande do Sul. Naquela altura, a população aproximava-se dos 60 milhões de habitantes.

Com vistas ao processo eleitoral, manteve-se o sufrágio universal e direto, com o voto obrigatório e secreto. Para votar, o eleitor tinha de exibir o seu título eleitoral e ter o seu nome constante da lista de eleitores de uma determinada seção, salvo as exceções previstas em lei. Em não votando e não justificando a sua ausência até trinta dias após a realização do pleito, ele incorreria em multa.

Além do mais, sem o comprovante de votação, ou mesmo a justificativa de ausência de votação ou o recibo de pagamento de eventual multa, o eleitor não podia inscrever-se em concurso público, ser investido ou empossado em cargo público. Se já servidor ou empregado público, não receberia os rendimentos correspondentes ao segundo mês subseqüente ao da eleição. O eleitor em situação eleitoral irregular não poderia, ainda, participar de concorrências públicas ou obter empréstimos de instituições estatais.

Em outubro, a coligação PSD-PTB derrotou a UDN. Seria a vitória da vertente nacionalista, materializada como um ideário de desenvolvimento, na medida do possível, autônomo. Contudo, os derrotados não aceitariam tão facilmente o resultado e tentariam impedir a posse do eleito.

Nas Forças Armadas, os oficiais dividiram-se em duas posições: os alinhados – em sua maioria, oficiais da Marinha e da Aeronáutica–, componentes da Cruzada Democrática, favoráveis à intervenção no plano político, e os posicionados – majoritariamente do oficialato do Exército –, unidos em torno do movimento militar constitucionalista. Na realidade, a divisão vinha desde a eleição para o Clube Militar em 1952, na qual a chapa liberal e pró-estadunidense havia derrotado a de inclinação nacionalista.

Com o intuito de garantir a posse de Kubitschek-Goulart, seria organizado o movimento de 11 de novembro, no qual se destacaria a participação do General Henrique Teixeira Lott, ministro da Guerra, a favor da legalidade – os adversários alcunhariam a movimentação, de modo pejorativo, de “novembrada”. Em janeiro de 1956, a chapa vitoriosa seria empossada.

Antes do pleito, a Lei nº 2.550, de 25 de julho de 1955, havia determinado que os documentos eleitorais expedidos até 31 de dezembro de 1955 perderiam a sua validade a partir de 1º de julho do ano seguinte. Desde janeiro de 1956, o eleitor receberia um extrato de sua folha individual de votação, em cujo modelo, a ser delineado pelo Tribunal Superior Eleitoral, constariam os elementos necessários para sua identificação, como: nome, data de nascimento, naturalidade, estado civil, profissão, filiação, endereço, seção, zona, município, número de inscrição e circunscrição, além da foto. A resolução que disciplinava o assunto seria expedida em 1957.

Referência

8º título eleitoral - 1957. In: ARRAES, Virgílio Caixeta. Títulos eleitorais: 1881-2008. Brasília: Tribunal Superior Eleitoral; Secretaria de Gestão da Informação, 2009. (Série Apontamentos, 2), p. 57 - 61.

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